Mr China é o livro que conta a história do primeiro americano que resolveu investir na China, ainda nos anos 90. Não era simplesmente “venture capital”, porque as condições de contorno eram muito mais complexas. Existiam barreiras de toda a ordem: língua, falta de legislação, falta de empreendedores no modelo clássico, moeda, estratégia de saída, etc...
O livro Amazônia 20* andar conta a saga de João Augusto Fortes e Bia Saldanha que, na de década de 90, saíram das areias escaldantes de Ipanema e foram empreender no Acre, em plena Amazônia. Ambos tinham o sonho de integrar a floresta ao Mundo do Capitalismo. Todos os astros estavam alinhados: os povos da floresta, entre eles Ailton Krenak, abençoavam a iniciativa, o BNDES financiou, os empresários eram competentes e audaciosos, e havia demanda global para o produto.
A iniciativa era baseada em um “Couro Vegetal ”, vindo do látex, que servia para itens de luxo tais como bolsas da grife Hermes, por exemplo. Bia e João criaram um processo de vulcanização simples, na própria floresta, não apenas integrando o trabalho dos habitantes locais à uma cadeia de fornecimento global, como saindo da sina de vendedores de produtos agrícolas.
Hoje, quando um jovem usa um tênis “Veja / Vert”, de origem francesa, que é o único tênis branco, do mundo, que se mantém limpo, e cujo faturamento supera centenas de milhões de euros, está pisando em um produto de uma cadeia de fornecimento brasileira, montado por Bia Saldanha, carioca moradora do Acre.
A marca Amazônia vende globalmente, e os produtos naturais são desejados. A questão, portanto, não é se existe demanda, mas as condições de se empreender dentro do ambiente Amazônico.
A Floresta é mais forte, os desafios logísticos são imensos, as regras do mundo dos negócios não se encaixam nas condições da vida na mata. Todos esses elementos estão no livro e na historia de Amazônia 20* andar. Qualquer empreendedor que deseje lidar com a Amazônia precisa lê-lo.
Passados 30 anos, a China virou a economia mais pujante do planeta Terra, enquanto que a Amazônia, a mais pujante biodiversidade do planeta, continua uma promessa.
Passados 30 anos, a China se propôs um programa para tornar-se a economia mais eco-friendly do Planeta, e a Amazônia permanece uma incógnita: a floresta ainda existirirá, como a conhecemos, nas próximas décadas?
Uma coisa é certa: a floresta Amazônica não se mantém se as populações lá existentes não cuidarem dela. Portanto, cabe integrá-las à cadeia de formação de valor, respeitando que a floresta tem que continuar em pé.
Fui ler a famosa entrevista póstuma de Chico Mendes ao JB, em 1988, publicada 2 dias após seu assassinato, assassinato este motivado pelas ideias que defendia. Transcrevo aqui uma resposta que tanto elucida a polêmica que dura até hoje: Como preservar a floresta e, ao mesmo tempo, fazer com que sua população prospere? Seguem as palavras de um homem que nasceu na floresta e que, como seringueiro, liderava um grupo que vivia em harmonia com os povos originais.
“Sabíamos que o desmatamento era nosso fim e de todos os seres vivos existentes na floresta. Mas a coisa terminava aí. As pessoas falam: 'Vocês querem impedir o desmatamento e transformar a Amazônia em santuário? Intocável?'
Estava ai o impasse. A resposta veio através da Reserva Extrativista. Vamos utilizar a selva de forma racional, sem destruí-la. Os seringueiros, os índios, os ribeirinhos, há mais de 100 anos ocupam a floresta. Nunca a ameaçaram. Quem a ameaça são projetos agropecuários, os grandes madeireiros, e as hidroelétricas, com suas inundações criminosas. Nas reservas extrativistas, nós vamos comercializar e industrializar os produtos que a floresta generosamente nos concede.
Temos na floresta o abacaba, o patoá, o assaí, o buriti, a pupunha, o babaçu, o tucumã, a copaíba, o mel de abelha, que nem cientistas conhecem. E tudo isso pode ser exportado e comercializado. A universidade precisa vir acompanhar a Reserva Extrativista. Estamos abertos a ela. A Reserva Extrativista é a única saída para a Amazônia não desaparecer. E mais: a reserva não terá proprietários. Ela vai ser um bem comum da comunidade. Teremos usufruto, não a propriedade.”
Nas palavras póstumas de Chico Mendes, encontramos o caminho. O desafio mega. A solução? Só a união de homens e mulheres de boa vontade e desprovidos de egos.
A floresta é, antes de tudo, uma lição de humildade. Nas palavras de Chico Mendes: "podemos ter o usufruto mas não a propriedade."
Comments